Terça, 09 Agosto 2022 23:15

OFS e o Espelho da Perfeição: reflexão sobre o capítulo XVIII

Capítulo XVIII

 

Como induziu e ensinou os primeiros frades a pe­dir esmolas, porque tinham vergonha.

 

1 Quando São Francisco começou a ter irmãos, alegrava-se tanto com a conversão deles e que o Senhor lhe dera uma boa companhia, e tanto os amava e venerava que não os mandava pe­dir esmolas, 2 sobretudo porque percebia que tinham vergonha de ir. Então, poupando-os da vergonha, ia todos os dias pedir esmo­las sozinho.

3 Como isso o cansava muito, principalmente porque no século tinha sido um homem delicado e de frágil compleição, e também porque fica­ra ainda mais debilitado pela demasiada abstinência e austeridade. 4 Considerando que não podia carregar sozinho todo esse peso e que os outros eram chamados à mesma tarefa, mesmo que tivessem ver­gonha de fazer isso, porque ainda não sabiam bem como se fazia e não eram tão sensíveis para dizer: “Também nós queremos pedir es­molas”, 5 ele lhes disse: “Caríssimos irmãos e filhinhos meus, não vos envergonheis de pedir esmola, porque o Senhor se fez (cf. 2Cor 8,9) pobre por nós neste mundo e, a seu exemplo, escolhe­mos o caminho da mais verdadeira pobreza. 6 Pois esta é nossa heran­ça, que o Senhor Jesus Cristo adquiriu e deixou para nós e para to­dos os que, a seu exemplo, querem viver na santíssima pobreza. 7 Na verdade, digo-vos que muitos dos mais nobres e mais sábios deste século virão a esta congregação e considerarão uma grande honra e graça ir pedir esmolas. 8 Então, ide esmolar com confiança e de ânimo alegre, com a bênção de Deus; e deveis ir esmolar com mais liberdade e alegria do que aquele que com uma moedinha conseguisse cem denários, 9 porque ofereceis o amor de Deus a quem pedis esmola, dizendo: Dai-nos uma esmola por amor do Senhor Deus. Comparando com Ele, o céu e a terra são um nada”.

10 Mas porque os frades ainda eram poucos, não pôde enviá-los dois a dois, mas enviou (cf. Lc 10, I) cada um em separado pelos castelos e vilas. 11 E aconteceu que, quando eles voltavam com as esmolas que tinham encontrado, cada um mostrava ao bem-aventurado Francisco suas esmolas recebidas. E um dizia ao outro: “Eu consegui uma esmola maior do que a tua”. 12 O bem-aventurado Francisco alegrou-se por vê-los alegres e contentes. Desde então, cada um pedia espontaneamente a permissão de ir esmolar.

 

Reflexão:

Mais um texto que põe a nossa frente aspectos duros da vida dos primeiros frades, que ainda eram penitentes. Como já tratado, está explícito que o autor do texto faz da parte do grupo que queria ver os irmãos vivendo uma pobreza mais radical, por isso ele trata aqui da questão do pedir esmolas. Sabemos que com o tempo essa prática foi transformando-se, mas aqui o irmão chama a atenção que para o fundador esse era um traço fundamental.

Aqui podemos falar um pouco sobre formação. Vemos, de certa forma, um modelo de como Francisco pensava a iniciação dos irmãos no seu grupo originário. Primeiro ele os recebe. A recepção não tratava-se de um momento de pressão por participação. Na verdade, ele queria que os irmãos ficassem bem. Que se adaptassem. Principalmente, por tratar-se de uma ruptura muito grande na vida. Ele sabia disso, por isso não exigia muito no início.

Porém, isso não podia ser para sempre. Os irmãos não podiam tornar-se um peso para os outros. Mas é a formação que vai levá-los a esse discernimento. Por isso, Francisco mais uma vez vai ao seu maior exemplo, Jesus Cristo. Segundo o texto, ele informa que Jesus também pediu esmola. A pobreza do Senhor tornava-se então o exemplo. Assim como ele todos os que fariam parte do carisma iriam ser esmoleres. Pedir para alimentar-se ou para ajudar aos leprosos e desvalidos era uma das bases da vida que ele queria construir.

Para que entendessem, ele partilhava suas impressões e descobertas da caminhada abraçada. Outro ensinamento é que o amor aos pobres é retribuído pelo amor de Deus. Deixando claro que esse Amor não se comparava a nada que existia e nada que podia ser visto pelos olhos humanos.

Depois da formação ele passou a enviá-los. E aqui outra dica. Se a formação for frutífera os irmãos farão missão com grande alegria colhendo muitos frutos. Segundo o texto, ser penitente, ou irmão menor, não tornou-se um peso. Todos queriam participar do trabalho. Não eram apenas sócios de um clube com direitos e deveres. Na verdade, passavam a entender que como irmãos tinham que servir o Reino. E aqueles que seguem o carisma francisclariano tem uma forma própria de vivenciar sua fé.

Esse trecho nos faz pensar sobre como está sendo feita a nossa formação. Que fraternidades estamos construindo? A recepção dos nossos iniciantes deve ser agradável em reuniões que demonstrem nossa espiritualidade. A formação deve ter conteúdo que os leve a conhecer como é a vida dos Franciscanos e Franciscanas seculares.

Para quem conhece a história das fraternidades penitenciais no século XIII e a forma como foram influenciadas pelos primeiros frades menores, sabe que alguns elementos, como o pedir e doar para quem precisa, são fundamentais e devem ser ensinados na formação. Sobre isso que se trata o texto. Nossa identidade está ligada à esmola. Esmola para a fraternidade cuidar de seus irmãos e para que o excesso seja levado para outros que não fazem parte da fraternidade.

Em um país que hoje, em 2022, tem 33 milhões de famintos, certamente temos irmãos entre nós com necessidades materiais. Devemos partilhar e esmolar com eles. Além disso, com certeza, na vila, na rua e na cidade em que nossa fraternidade se encontra devemos esmolar pelos que precisam. Nesse momento nosso carisma é fundamental.

  

Para meditar:

 

1 - Com temos feito a formação de nossa fraternidade? Será que ela leva nossos irmãos e irmãs a servirem ao Reino com alegria e tendo clareza do que é o nosso carisma?

2 - Nossa fraternidade tem sensibilidade para entender que alguns irmãos e irmãs precisam de ajuda? Partilhamos nossos dons com eles e com os outros necessitados?

3 - Quais aspectos de nosso carisma temos nos preocupado em transformar na vida daqueles que querem ser franciscanos e franciscanas seculares?

 

Texto de Jefferson Eduardo dos Santos Machado - Coordenador de Formação da Fraternidade Nossa Senhora Aparecida - Nilópolis (RJ)

 

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