1. Sempre de novo, cristãos e franciscanos seculares, precisamos refletir sobre os passos que estamos dando em nossa vida. Não podemos caminhar a esmo. Sentimos necessidade de voltar ao ponto de partida. Não nos tornamos franciscanos sem mais nem menos. Antes do tempo de nossa formação e profissão na Ordem tinha começado a existir em nós um enamoramento pelo Senhor Jesus e pelo Evangelho. Vivendo numa comunidade de fé, ou tendo sido sacudido pelo Senhor que nos colocou num caminho de conversão, demo-nos conta que havia um chamamento para sermos franciscanos. Sentimos que tínhamos sido chamados para viver a alegria do seguimento de Cristo, no seio da família espiritual de Francisco e de Clara. Necessário, pois, sempre voltar a esse início. Os formadores ajudarão os formandos a discernir sua escolha e verificar os momentos em que o Senhor andou sondando suas vidas. Não se entra na Ordem por entrar, como se fosse uma mera associação piedosa. Reque-se um chamamento que se chama vocação. O discernimento da vocação é a primeira finalidade da formação.
2. Quisemos ser discípulos de Jesus. O Documento de Aparecida (CELAM, 2007) nos fala do processo de formação dos discípulos missionários: encontro pessoal e profundo com o Cristo Ressuscitado; empreender um caminho de conversão, de transformação, de achar doce o amargo e, se possível, o amargo, doce; o tornar-se discípulo de Jesus; viver em íntima comunhão de vida com ele; e partir em missão. Todo cristão precisa percorrer estas etapas. Os franciscanos não estão dispensados desse empenho. A formação do discípulo leva tempo. Nós, ao nos aproximarmos do Senhor na família franciscana, somos discípulos missionários com o jeito de Francisco e Clara. Esse processo de nascimento do discípulo requer fraternidades sólidas, formadores que sejam discípulos, que tenham humildade de coração e prestem atenção ao que a Igreja está vivendo.
3. Desnecessário dizer que vivemos um tempo de instabilidade e de mudanças profundas na sociedade, na Igreja, em nossa Ordem. Por isso, é sempre um gesto de bravura querer dar orientações a respeito da formação humana, cristã e franciscana em nossos tempos. No momento que vivemos, tudo tem gosto de provisório e de passageiro. Fica, no entanto, a convicção mais profunda que os irmãos que já vivem entre nós e os que chegam precisam receber uma formação sólida. Desafio particular é a boa qualidade da formação permanente. Muitos nos damos por satisfeitos pelo que foi conseguido no tempo dos começos. Vivemos apenas preocupados em conservar e não em renovar, vivemos do dinheiro que está na poupança. É a lei da inércia. Apesar de todas as perplexidades os formadores e os conselhos locais são convocados a transmitir um gosto pelo novo, pelo amanhã, convidar os irmãos que se lancem numa aventura cristã e franciscana. As pessoas não podem parar. Precisam seguir em frente. Uma palavra forte: coragem. Uma preocupação: procurar águas mais profundas.
4. Numa sociedade que duvida de tudo e de si mesma, que tem uma visão “desencantada” do mundo, exprimindo indiferença e por vezes debochando dos valores morais e cristãos, será preciso mostrar confiança no futuro. O Evangelho não pode ser um texto que descansa em páginas de papel ou nos arquivos do computador. Os formandos e os formadores prestarão atenção na sinalização do Espírito que sopra para onde quer. O problema é sempre saber para o Espírito anda soprando.
5. Nutrimos uma paixão esponsal pelo Senhor. Não podemos deixar de ter o cuidado de fomentar uma vida de intimidade com o Senhor: uma oração sólida e suculenta, contato carinhoso com sua Palavra, sua presença na Eucaristia, retiros bem feitos que sejam retiros, leituras, familiaridade com os salmos e textos do Novo Testamento. Normalmente, depois de certo tempo de vida em fraternidade, os franciscanos deveriam compreender que vivem no mundo, mas não são do mundo. Esta seria a prova de que passaram no “vestibular”. Necessário instaurar-se o hábito de leitura espiritual da vida, de um regular exame de consciência. Até que ponto nossas fraternidades fazem uma profunda experiência do Senhor na oração?
6. Cada irmão que ingressa na fraternidade precisa ter em mãos as rédeas de sua vida. Ele é o primeiro responsável por sua formação. Os que procuram nossas fraternidades e os que nela já vivem querem e desejam buscar o seguimento de Cristo no Evangelho e a consequente busca da santidade de vida. Não querem viver na superficialidade e mediocridade.
7. No campo da formação não basta apenas ilustrar a mente com elementos da fé e da tradição franciscana. Trata-se de fazer com que aqueles que chegam e os que estão chegando se identifiquem com esse movimento de renovação evangélica. Nunca é demais voltar ao tema da identidade franciscana.
8. Será preciso trabalhar os valores humanos: maturidade, coragem, têmpera, consciência do que significa assumir compromissos, superar melindres e susceptibilidades, capacidade de conviver com outras pessoas, saber acolher as diferenças. Prestar atenção de não se fazer uma formação marcada pelo devocionalismo. Por isso será preciso estudar de verdade. Repito: estudar, ler, inventar tardes de estudo, ler biografias de Francisco.
9. A formação franciscana vai na linha da impregnação dos valores que marcaram Francisco e Clara: postura de simplicidade, vida despojada, gosto pela fraternidade, sensibilidade para com os pobres, desejo de preservar a natureza, vontade de não se sobrepor aos outros, senso de partilha, não perder o Espírito do Senhor, ir pelo mundo e buscar o silêncio da montanha, estar em constante desapropriação, ter gosto pelas coisas modestas, distanciar-se do consumismo. Santo Inácio de Loiola: Não é o muito saber que alimenta, mas quando se degusta as coisas interiormente”.
10. Ponto importante da vida dos franciscanos seculares é a realização de reuniões gerais ou outras que sejam de “excelente” qualidade. A reunião é sacramento de nosso querer bem. Ela será preparada com todo esmero. Não se pode perder a motivação. Cuidar-se-á de que todos dela participem de verdade. Não pode haver ausências aos encontros por desmotivação. Um Conselho local sábio valoriza cada irmão. Importante descobrir os talentos e qualidades de cada um, examinar onde e como podem prestar serviço. O irmão precisa sentir que existe, que conta aos olhos dos outros. Os ministros locais são servos através de quem o Senhor se aproxima dos outros irmãos.
11.Não somos uma piedosa associação de pessoas de boa vontade. Os franciscanos seculares são leigos que vão amadurecendo na medida que o tempo passa, na corresponsabilidade com a missão da Igreja. Segundo as possibilidades e qualidades de cada um será importante que possam ir pelo mundo, para reconstruir a Igreja que está em ruínas. Os irmãos não podem deixar de dar sua colaboração de qualidade à paróquia (catequese, liturgia, família, atividades de promoção). Poderiam ser preparados para o ministério do acompanhamento dos doentes, ministério da esperança e da Palavra. Os terceiros são leigos. Não se deve privilegiar serviços ligados à liturgia. A formação de um laicato maduro e não apenas devocional é de fundamental importância. Campos de ação de um laicato maduro: trabalho, educação, atendimento e promoção, política, ministério da catequese.
12.Nossas fraternidades terão a marca da alegria. Alegria não quer dizer baderna, nem barafunda. Sugestões para cultivar a alegria na fraternidade: cantos alegres e bonitos, preparar espaços que respiram beleza em sua simplicidade, presença de jovens franciscanos que cresçam com a fraternidade. Todas essas sugestões contribuem para formar.
13.Os Assistentes, de modo particular, deverão se fazer presente na vida dos irmãos com gosto. Sua ausência regular é sentida com um prejuízo sério. Assistentes alegres e convictos são a melhor propaganda para a Ordem.
14.Os Conselhos observarão os irmãos. Descobrirão lideranças que, no futuro, poderão assumir as responsabilidades na fraternidade. No momento das eleições será preciso fazer listas com irmãos que levarão adiante com fidelidade e pertinácia o projeto franciscano secular. Não se pode deixar que as coisas aconteçam e dizer que o resultado vem do Espirito Santo. O Deus do vento e do fogo age, mas conta com nosso bom senso.
Frei Almir Ribeiro Guimarães