Cidade do Vaticano – No final da tarde desta quarta-feira (25), na Basílica de São Paulo Fora dos Muros, o Papa Francisco presidiu a cerimônia das vésperas que recorda a conversão de São Paulo. A celebração marcou o encerramento da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos, que teve tema inspirado no quinto capítulo da segunda Carta de São Paulo aos Coríntios: “Reconciliação – É o amor de Cristo que nos impele”. A mensagem do Papa na homilia foi motivada pelo mesmo caminho e empenho ecumênico do diálogo através dos “embaixadores da reconciliação”, “unidos no sofrimento pelo nome de Jesus”.
Francisco começou sua exortação lembrando o encontro de Paulo com Jesus, na estrada para Damasco, que transformou radicalmente a vida do apóstolo ao aderir ao “amor gratuito e imerecido de Deus, a Jesus Cristo crucificado e ressuscitado”. Uma feliz notícia, a da “reconciliação do homem com Deus”, que Paulo não poderia guardar para si mesmo e foi impelido a proclamar.
“O amor de Cristo”: não se trata do nosso amor por Cristo, mas do amor que Cristo tem por nós. Da mesma forma, a reconciliação para a qual somos impelidos não é simplesmente uma iniciativa nossa: é primariamente a reconciliação que Deus nos oferece em Cristo. Antes de ser esforço humano de crentes que procuram superar as suas divisões, é um dom gratuito de Deus. Como resultado desse dom, a pessoa perdoada e amada é chamada, por sua vez, a proclamar o evangelho da reconciliação em palavras e obras, a viver e dar testemunho de uma existência reconciliada.
Nessa perspectiva, “podemos hoje nos perguntar”, disse Francisco, “como é possível proclamar esse evangelho de reconciliação depois de séculos de divisões? ”. O caminho vem do próprio Paulo que enfatiza que “a reconciliação em Cristo não se pode realizar sem sacrifício”.
ÍNTEGRA DA HOMILIA
O encontro com Jesus na estrada para Damasco transforma radicalmente a vida de Paulo. A partir de então, para ele, o sentido da existência já não está em confiar nas próprias forças para observar escrupulosamente a Lei, mas em aderir com todo o seu ser ao amor gratuito e imerecido de Deus, a Jesus Cristo crucificado e ressuscitado. Conhece, assim, a irrupção de uma vida nova, a vida segundo o Espírito, na qual, pelo poder do Senhor ressuscitado, experimenta perdão, confidência e conforto. E Paulo não pode guardar para si mesmo esta novidade: é impelido pela graça a proclamar a feliz notícia do amor e da reconciliação que Deus oferece plenamente em Cristo à humanidade.
Para o Apóstolo dos Gentios, a reconciliação do homem com Deus, da qual foi feito embaixador (cf. 2 Cor 5, 20), é um dom que vem de Cristo. Vê-se isto claramente no texto da II Carta aos Coríntios, onde se foi buscar, este ano, o tema da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos: «O amor de Cristo impele-nos para a reconciliação» (cf. 2 Cor 5, 14-20). «O amor de Cristo»: não se trata do nosso amor por Cristo, mas do amor que Cristo tem por nós. Da mesma forma, a reconciliação para a qual somos impelidos não é simplesmente iniciativa nossa: é primariamente a reconciliação que Deus nos oferece em Cristo. Antes de ser esforço humano de crentes que procuram superar as suas divisões, é um dom gratuito de Deus. Como resultado deste dom, a pessoa perdoada e amada é chamada, por sua vez, a proclamar o evangelho da reconciliação em palavras e obras, a viver e dar testemunho duma existência reconciliada.
Nesta perspectiva, podemos hoje perguntar-nos: Como é possível proclamar este evangelho de reconciliação depois de séculos de divisões? O próprio Paulo nos ajuda a encontrar o caminho. Ele sublinha que a reconciliação em Cristo não se pode realizar sem sacrifício. Jesus deu a sua vida, morrendo por todos. De modo semelhante os embaixadores de reconciliação, em seu nome, são chamados a dar a vida, a não viver mais para si mesmos, mas para Aquele que morreu e ressuscitou por eles (cf. 2 Cor 5, 14-15). Como ensina Jesus, só quando perdemos a vida por amor d’Ele é que verdadeiramente a temos ganha (cf. Lc 9, 24). É a revolução que Paulo viveu, mas é também a revolução cristã de sempre: deixar de viver para nós mesmos, buscando os nossos interesses e promoção da nossa imagem, mas reproduzir a imagem de Cristo, vivendo para Ele e de acordo com Ele, com o seu amor e no seu amor.
Para a Igreja, para cada Confissão Cristã, é um convite a não se basear em programas, cálculos e benefícios, a não se abandonar a oportunidades e modas passageiras, mas a procurar o caminho com o olhar sempre fixo na cruz do Senhor: lá está o nosso programa de vida. É um convite também a sair de todo o isolamento, a superar a tentação da autorreferência, que impede de individuar aquilo que o Espírito Santo realiza fora do nosso próprio espaço. Poderá realizar-se uma autêntica reconciliação entre os cristãos, quando soubermos reconhecer os dons uns dos outros e formos capazes, com humildade e docilidade, de aprender uns dos outros – aprender uns dos outros –, sem esperar que primeiro sejam os outros a aprender de nós.
Se vivermos este morrer para nós mesmos por amor de Jesus, o nosso estilo velho de vida é relegado para o passado e, como aconteceu a São Paulo, entramos numa nova forma de existência e comunhão. Com Paulo, poderemos dizer: «O que era antigo passou» (2 Cor 5, 17). Olhar para trás é útil e muito necessário para purificar a memória, mas fixar-se no passado, delongando-se a lembrar as injustiças sofridas e cometidas e julgando com parâmetros apenas humanos, pode paralisar e impedir de viver o presente. A Palavra de Deus encoraja-nos a tirar força da memória, a recordar o bem recebido do Senhor; mas pede-nos também que deixemos o passado para trás a fim de seguir Jesus no presente e, n’Ele, viver uma vida nova. Àquele que renova todas as coisas (cf. Ap 21, 5), consintamos-Lhe de nos orientar para um futuro novo, aberto à esperança que não desilude, um futuro onde será possível superar as divisões e os crentes, renovados no amor, encontrar-se-ão plena e visivelmente unidos.
Enquanto avançamos pelo caminho da unidade, recordamos este ano de modo particular o quinto centenário da Reforma Protestante. O facto de católicos e luteranos poderem hoje recordar, juntos, um evento que dividiu os cristãos e de o fazerem com a esperança posta sobretudo em Jesus e na sua obra de reconciliação, constitui um marco significativo, alcançado – graças a Deus e à oração – através de cinquenta anos de mútuo conhecimento e de diálogo ecuménico.
Implorando de Deus o dom da reconciliação com Ele e entre nós, dirijo as minhas cordiais e fraternas saudações a Sua Eminência o Metropolita Gennadios, representante do Patriarcado Ecuménico, a Sua Graça David Moxon, representante pessoal em Roma do Arcebispo de Cantuária, e a todos os representantes das diversas Igrejas e Comunidades eclesiais aqui reunidos. Saúdo com particular alegria os membros da Comissão Mista para o Diálogo Teológico entre a Igreja Católica e as Igrejas Ortodoxas Orientais, a quem desejo um fecundo trabalho na Sessão Plenária que se desenrola nestes dias. Saúdo também os alunos do Instituto Ecuménico de Bossey – vi-os esta manhã muito contentes –, que visitam Roma para aprofundar o seu conhecimento da Igreja Católica, e os jovens ortodoxos e todos os ortodoxos orientais que estudam em Roma, graças às bolsas de estudo do Comité de Colaboração Cultural com as Igrejas Ortodoxas, sediado no Conselho Pontifício para a Promoção da Unidade dos Cristãos. Aos Superiores e a todos os Colaboradores deste Dicastério, exprimo a minha estima e gratidão.
Amados irmãos e irmãs, a nossa oração pela unidade dos cristãos é participação na oração que Jesus dirigiu ao Pai, antes da Paixão, «para que todos sejam um só» (Jo 17, 21). Nunca nos cansemos de pedir a Deus este dom. Na expectativa paciente e confiada de que o Pai conceda a todos os crentes o bem da plena comunhão visível, prossigamos o nosso caminho de reconciliação e diálogo, encorajados pelo testemunho heroico de tantos irmãos e irmãs, de ontem e de hoje, unidos no sofrimento pelo nome de Jesus. Aproveitemos todas as oportunidades que a Providência nos oferece para rezar juntos, anunciar juntos, amar e servir juntos sobretudo quem é mais pobre e negligenciado.
AUDIÊNCIA
Cerca de 7 mil pessoas participaram do encontro semanal com o Papa nesta quarta-feira (25/01) na Sala Paulo VI. Após saudar os participantes, Francisco deu início à audiência com uma catequese sobre Judite, a grande heroína de Israel que encorajou os chefes e o povo de Betúlia a esperarem incondicionalmente no Senhor e assim fazendo, libertou a cidade da morte.
A narração conta que o exército de Nabucodonosor, comandado pelo general Holofernes, assediou Betúlia cortando o fornecimento de água e enfraquecendo assim a resistência da população. A situação ficou dramática ao ponto que os moradores pedem aos anciãos que se rendam aos inimigos. O fim é inevitável, a capacidade de confiar em Deus exaurida, e para fugir da morte, não resta que se entregar.
O Pontífice continuou o relato: “Diante de tanto desespero, os chefes do povo propõem-lhe esperar ainda cinco dias, para ver se Deus os socorreria. É aqui que entra Judite: ‘Agora, colocais o Senhor todo-poderoso à prova! Mesmo que Ele não queira enviar-nos auxílio durante estes cinco dias, tem poder para nos proteger dos nossos inimigos, em qualquer outro momento que seja do seu agrado. Esperemos pela sua libertação! ’”
Francisco ressaltou a figura de Judite naquela situação e revelou aos presentes: “Esta mulher, viúva, arrisca até fazer um papelão diante dos outros… mas é corajosa, vai adiante. Esta é uma minha opinião pessoal: as mulheres são mais corajosas que os homens”.
Com a força de um profeta, aquela mulher convida a sua gente a manter viva a esperança no Senhor. E aquela esperança foi premiada: Deus salvou Betúlia pela mão de Judite. A este ponto, o Papa refletiu e pediu aos fiéis: “Com ela, aprendamos a não impor condições a Deus. Confiar Nele significa entrar nos seus desígnios sem nada pretender, aceitando inclusivamente que a sua salvação e o seu auxílio nos cheguem de modo diferente de nossas expetativas. Nós pedimos ao Senhor vida, saúde, amizade, felicidade… E é justo que o façamos; mas na certeza que Deus sabe tirar vida até da morte, que se pode sentir paz mesmo na doença, serenidade mesmo na solidão e felicidade mesmo no pranto. Não podemos ensinar a Deus aquilo que Ele deve fazer, nem aquilo de que temos necessidade. Ele sabe isso melhor do que nós; devemos confiar, porque os seus caminhos e os seus pensamentos são diferentes dos nossos.
E outra vez, antes de concluir, o Papa mencionou o papel das mulheres e avós: “Quantas vezes ouvimos palavras corajosas de mulheres humildes… que pensamos, sem desprezá-las, que são ignorantes… mas são as palavras da sabedoria de Deus, as palavras das avós que tantas vezes sabem dizer a coisa certa… palavras de esperança. Elas têm experiência de vida, sofreram tanto. Confiaram em Deus, que lhes deu este dom”. “Esta é a oração da sabedoria, da confiança e da esperança”, terminou o Papa, concedendo em seguida a bênção apostólica
Fonte: franciscanos.org.br/