Segunda, 29 Mai 2017 13:59

Falece o missionário Frei Márcio de Araújo Terra

 09.02.1949 † 29.05.2017

Aos 68 anos, faleceu nesta segunda-feira (29/05), às 5 horas, Frei Márcio de Araújo Terra (46 de vida religiosa franciscana, sendo 15 na missão de Angola). Frei Márcio estava internado no Rio de Janeiro desde o dia 20 de março, quando sofreu uma queda na laje da casa da Fraternidade da Rocinha. Com hemorragia cerebral, passou por cirurgia, mas sua recuperação alternou altos e baixos.

Como no boletim do dia 6 de maio, quando Frei Sandro informava que, nas últimas semanas, numa alternância de períodos de esperança, otimismo e preocupação, a situação de saúde de Frei Márcio foi aos poucos se deteriorando. Uma infecção era debelada, mas logo outra aparecia, e persistia. Uma cirurgia para desobstruir o intestino agravou mais o quadro. O pouco de interação que havia, aos poucos foi desaparecendo. O quadro passou de grave para muito grave. Houve a necessidade de hemodiálise, e a infecção avançava para uma septicemia. Vários de seus familiares, inclusive sua mãe, dona Procopinha, de 89 anos, estiveram na Rocinha, acompanhando de perto o desenrolar da situação. A comunidade paroquial acompanhava e rezava com muita fé.

Seu corpo está sendo levado, neste momento (9h30), para a Paróquia Nossa Senhora da Boa Viagem, na Rocinha, onde será velado até as 8 horas de amanhã (30/5), quando será celebrada a Missa de Exéquias. Em seguida, seu corpo será transladado para o Convento Santo Antônio, no Largo da Carioca, onde será sepultado.

O FRADE MENOR

Quando ainda era seminarista, iniciando sua caminhada como frade menor, Frei Márcio foi muito claro ao dizer que o impulso para a sua decisão “era o testemunho do Cristo, que se fez o menor de todos, levando a eles a Boa Nova da libertação”. Para ele, o desejo de estar a serviço do Reino de Deus na construção de uma sociedade mais justa e fraterna era o alimento de sua espiritualidade e a identificação com a causa dos explorados movia a sua via consagrada.

Foi com esse desejo, que sempre alimentou, que Frei Márcio ingressou no Seminário de Guaratinguetá para vocações adultas. “Desde criança mantinha o desejo de ser religioso. Um padre eme prometeu que assim que eu terminasse o grupo escular (ensino fundamental), eu poderia ir para o Seminário. Ele nunca mais voltou e foi no final da minha adolescência que o desejo voltou mais forte e eu pude ingressar no Seminário”, contou o mineiro de Alterosa, que se autodefinia como introvertido e calmo. Ele era o terceiro dos sete filhos (um irmão e seis irmãs) do casal Juarez e Procópia. Frei Márcio nasceu em Alterosa (MG), no dia 9 de fevereiro de 1949 e foi ordenado sacerdote no dia 18 de dezembro de 1976.

Para ele, a vida religiosa franciscana é vigorosa quando se funda na pobreza evangélica. Seu trabalho preferido era junto às Comunidades Eclesiais de Base (CEB), onde acreditava que uma ação verdadeiramente coletiva, acima de quaisquer interesses individuais e moldada pelos mais nobres sentimentos de humanidade, solidariedade, compaixão e amor ao próximo poderia mudar o mundo.
Nos quinze anos que passou na Missão Franciscana de Angola, Frei Márcio fundou o Projeto Nossos Miúdos, que acolhe meninos de rua na capital, Luanda, sendo a maioria vítimas da guerra de mais de 30 anos que destruiu o país. Para este franciscano, que ingressou na Ordem dos Frades Menores no dia 20 de janeiro de 1971, a sua experiência missionária foi muito marcante porque conheceu o país angolano destruído, no final da guerra, e participou de sua reconstrução.

Dizia que o grande desafio em Angola não foi a guerra, mas reconstruir o “homem angolano depois da guerra”. Essa, para ele, é a grande missão hoje da Fundação Imaculada Mãe de Deus e da Igreja local. “O governo constrói estradas, hospitais, escolas e nós construímos o homem. E é a tarefa mais difícil. Reconstruir ponte, com diamantes e petróleo angolanos, não é tão difícil assim, mas reconstruir a alma do ser humano, dilacerada durante 35 anos – contando a guerra civil e a guerra pós-independência -, é muito desafiador. Um jovem de 35 anos, que tem toda a sua força de trabalho, nasceu na guerra, cresceu e foi educado nela. Ele praticamente só conhece a linguagem da violência. Falar de fraternidade, solidariedade soa estranho para ele. Pode até ser que bata no coração dele: ‘É isso que eu quero, mas não foi isso que vivi ou experimentei durante toda a minha vida’! A religião tem um papel muito importante neste momento”, dizia em entrevista ao retornar ao Brasil nas férias de 2009.

Dados Pessoais:

Nascimento: 09.02.1949 – Alterosa (MG)
20.01.1971 – Admissão ao Noviciado
20.01.1972 – Professa temporariamente na Ordem dos Frades Menores
04.10.1975 – Professa solenemente na Ordem dos Frades Menores
18.12.1976 – Ordenação presbiteral

 

Atividades evangelizadoras

09.12.1977 – Vigário paroquial em Vila Velha – Paróquia
06.02.1982 – Coordenador da fraternidade e vigário paroquial em Vila Velha, na paróquia do Rosário (ES)
15.12.1982 – Vigário paroquial em Cabo Frio (RJ)
18.01.1989 – Vigário paroquial em Ipanema (RJ)
18.01.1992 – Vigário paroquial em Vila Velha (RJ)
10.12.1998 – A serviço da Fundação Mãe de Deus de Angola
15.03.1999 – Viagem para a Missão de Angola
22.01.2000 – Funda o Projeto Nossos Miúdos em Angola
30.04.2000 – 1º pároco da Paróquia de São Lucas de Angola
22.11.2000 – Vigário Paroquial da Paróquia São Lucas, em Luanda, Angola
12.09.2001 – Eleito conselheiro da Fundação Imaculada Mãe de Deus de Angola
20.12.2006 – Reeleito conselheiro da Fundação Imaculada Mãe de Deus
15.03.2008 – Vigário da Fraternidade S. Francisco de Assis, em Palanka, Angola
01.12.2016 – Vigário Paroquial na Rocinha, no Rio de Janeiro (RJ

 

 

DEPOIMENTOS

O pároco e vigário da Fraternidade São Francisco de Luanda, Frei Angelo José Luiz, está em férias no Brasil e deu o seguinte depoimento sobre Frei Márcio:

“Tive oportunidade de conviver com Frei Márcio em Luanda, no bairro de Palanka, onde está o Projeto Nossos Miúdos, e onde ele residiu desde o início da sua missão. Assim, ele se radicou na Paróquia São Lucas, como pároco durante um tempo e, aos poucos, identificando-se com um projeto voltado para crianças abandonadas no pós-guerra. Com sua caminhonete, ele percorria as ruas levando comida e roupas. Aos poucos, ele foi vendo a necessidade de ter um espaço para atender essas crianças. Foi assim nasceu o Projeto Nossos Miúdos que hoje nós, os frades, estamos dando continuidade.  Esse projeto tem uma padaria, que mantém esse serviço, e uma creche que foi inaugurada antes de ele retornar ao Brasil no final do ano passado.

Ele sempre foi um frade bastante dedicado no trabalho, na evangelização, na convivência com os leigos e os frades. Ele também sempre foi muito participativo, buscando sempre estar presente, embora até morando e dormindo fora da fraternidade. Mas não deixava de participar da comunidade dos frades.

Aos poucos, ele também se identificou muito com o Projeto Missionário do Kimbo São Francisco, um santuário que acolhe milhares de fiéis semanalmente. Desde o início, quando a Fundação assumiu este trabalho, ele esteve à frente da animação, da programação e das celebrações do Kimbo. Hoje, as pessoas são muito gratas a ele.

Outro trabalho com o qual ele se identificou muito foi com o programa ‘Gotas de Luz’ na Rádio Eclessia, emissora da Conferência dos Bispos de Angola. Duas vezes por semana, durante uma hora, ele interagia muito com os ouvintes. O bispo Dom Zeferino o chamava de a “Voz de Ouro”.

Devemos muito ao Frei Márcio pelo seu trabalho missionário, pelo seu esforço, pela sua dedicação, pela sua presença, pelo seu espírito crítico com relação a todo o nosso trabalho de evangelização – ele sempre teve uma visão muito crítica -, mas construtivo. Ele colaborou bastante com a Missão”, completou Frei Angelo, que retorna nesta quarta-feira, 31 de maio, a Luanda.

Para o frade angolano Frei Crisóstomo Pinto Ñgala, Frei Márcio deixa saudades. “Foi grande companheiro. Homem desapegado, homem de Deus. Mais um Santo intercessor dos miúdos abandonados”, disse.

 

R.I.P.

 

 

Fonte: Franciscanos

Ler 2304 vezes
© 2016 - Ordem Franciscana Secular do Brasil.
Edifício Darke, na Av. Treze de Maio, 23, Salas 2232 a 2234 - Centro, Rio de Janeiro - RJ, CEP 20031-007
Fone: (21) 3172-4789 ou (21) 99785-8960 (WhatsApp)
Email: ofsbr@terra.com.br