Quarta, 29 Março 2017 11:46

Falece o grande liturgista Frei Alberto Beckhäuser

Às 22h00 da noite de 28 de março, faleceu, em Petrópolis, Frei Alberto Beckhäuser. Ele estava internado no Hospital da Beneficência Portuguesa, e sofria de câncer no pâncreas, diagnosticado em janeiro deste ano. Na manhã de ontem, terça-feira, por boletim online, a pedido do guardião Frei Fábio Cesar Gomes, comunicávamos que o estado de Frei Alberto se agravava a cada dia. Mostrava-se extremamente fraco e fazia grande esforço quando deseja dizer algo. Nos últimos dias, quase sempre estava sedado, devido às dores. (Informaremos assim que possível o lugar do velório e o horário da Missa de Exéquias e do sepultamento).

Dados pessoais, formação e atividades

– Nasceu aos 20 de maio de 1935 (81 anos de idade), na Freguesia deSanta do Coqueiro Baixo, hoje também chamada Santa Teresinha, então, município de Criciúma, um tempo, pertencente ao Mun. de Nova Veneza e, hoje, Forquilhinha, SC.

– Frei Alberto era o quinto de 12 filhos do casal Ernesto Beckhäuser e Helena Hoepers. Seus pais são netos de imigrantes europeus. Apenas a avó paterna era nascida na Europa, mais precisamente, na Letônia, de religião batista. Por causa deste pormenor, seu pai Ernesto foi batizado na religião católica pelos 20 anos de idade.

- Seminário: – Nas Missões populares de 1947, foi convidado por Frei João Bosco Erdrich a ir com ele para ser missionário. O menino topou e, em 1948 entrou no Seminário de Rodeio, seguindo todo o percurso de formação na Província, passando por Rio Negro (1950-1952), Agudos (1953-1956), Noviciado em Rodeio (1957) (59 anos de Vida Franciscana), Filosofia em Curitiba (1958-1959) e Teologia em Petrópolis (1960-1963), onde fez a Profissão solene aos 23.12.1960 e foi ordenado presbítero aos15 de dezembro de 1962 (54 anos de Sacerdócio).

- Roma: – De 1963-1967 fez a Licença e o Doutorado em Teologia com Especialização em Sagrada Liturgia no Pontifício Ateneu Anselmiano, em Roma, com a graça de acompanhar e viver de perto vários anos do Concílio Vaticano II (1963-1965).

- Petrópolis: – De 1967-1973 foi Professor de Liturgia no Instituto Teológico Franciscano em Petrópolis, tendo sido também Assistente da Ordem III local como era chamada então, e da Fraternidade Regional. Foi algum tempo Vigário da Casa e Diretor do Instituto. Foi também Assistente de uma Equipe de Nossa Senhora. Foi Professor de Liturgia no CEFEPAL e Membro da Comissão de Tradutores dos Textos Litúrgicos da CNBB, que funcionava no Rio de Janeiro.

- Rodeio: – De 1974-1979, Mestre de Noviços, continuando a lecionar Liturgia em Petrópolis, no Instituto e no CEFEPAL, com cursos intensivos. Vigário da Casa.

- São Paulo: – De 1980-1982 viveu em São Paulo como Secretário da Província. Foi Assistente Espiritual da Fraternidade Regional da OFS, então VIII Região, abrangendo São Paulo e Mato Grosso.

- Petrópolis: – De 1983-1985, integrou a Equipe de Mestres em Petrópolis, sendo nomeado, em 1984, Assistente Espiritual e Pastoral da OFS Nacional pela OFM.

- Brasília: – De 1986-1991, Assessor de Liturgia da CNBB, sendo locado no Convento de Petrópolis, morando com os Frades em Brasília.

- Rio de Janeiro: – De 1992-1994, Convento de Santo Antônio no Rio de Janeiro como Diretor “virtual” do Santuário, Secretário Provincial da Evangelização Missionária e Coordenador de Traduções e Edições de Textos Litúrgicos da CNBB. Foi Vigário da Casa. Retomou também aulas de Liturgia em Petrópolis.

- Petrópolis: – A partir de 1995, Membro da Fraternidade São Francisco, junto ao futuro Instituto Teológico Franciscano: Professor de Liturgia no nosso Instituto, Secretário da Evangelização Missionária (1995-1997), Coordenador de Traduções e Edições de Textos Litúrgicos da CNBB, Assistente das Irmãs Clarissas na Gávea, Rio de Janeiro. De 2000 a 2003 foi assistente nacional da OFS, assistente das Clarissas do Rio de Janeiro, e assistente litúrgico dos Coral dos Canarinhos. Em 2004, foi nomeado novamente assistente espiritual das Irmãs Clarissas do Rio de Janeiro.

Da ficha autobiográfica de Frei Alberto (atualizada em 2014)

Tenho queda para música, mas nunca cheguei a dominar um instrumento, talvez por falta de empenho. Gostava, porém, da regência coral. Já no Seminário de Agudos regia o coro da turma, atividade que continuei a exercer no Noviciado, no Tempo da Filosofia, inclusive junto ao Coral do Josephsverein e nos anos da Teologia em Petrópolis. Neste período, com outros confrades, tive o privilégio de fazer o Curso de Canto Gregoriano no Instituto Pio X, no Rio de Janeiro. Frei Leto Bienias apreciava minha regência. Substituí-o na Regência dos Carinhos em suas férias na Alemanha, creio que em 1961. Frei Leto sonhava comigo para a Direção dos Canarinhos, chegando mesmo a custear um Professor de piano.

Em 1963, fui designado para estudar Liturgia e Música Sacra em Roma, para ser Professor de Liturgia e de Música na formação teológica dos frades. Visto ser impossível fazer as duas coisas, que exigiam tempo integral, pedi ao Ministro Provincial Frei Walter Kempf que definisse por qual matéria optar. Frei Walter mandou que me formasse em Liturgia e, na medida do possível, cursasse Música sacra. Frequentei um curso de História da Música, mas logo restringi-me à Liturgia.

Minha vida de frade foi dedicada praticamente à formação. São mais de  48 anos de aulas de Liturgia. A formação litúrgica dos frades; cursos, encontros nacionais e internacionais de Liturgia. Os estudos em Roma despertaram em mim a inclinação para a pesquisa e transmissão de uma compreensão teológica da Liturgia e sua espiritualidade, com interesse pastoral. Interessam-me questões como a natureza da participação ativa e frutuosa, a linguagem mítica, simbólica dos mistérios celebrados. Hoje leciono Liturgia no nosso Instituto Teológico em Petrópolis, no Seminário Diocesano de Petrópolis, no Pós-graduação de Liturgia em São Paulo. Fui convidado neste ano para dar Curso de Liturgia no ITEPAL, em Bogotá, na Colômbia e recebi convite para lecionar Liturgia na PUC do Rio a partir de 2002. São 35 anos de magistério, e de animação da vida litúrgica, enfrentando os altos e baixos da reforma e da renovação litúrgicas desejadas pelo Concílio Vaticano II e promovidas a partir dele. Voltando dos estudos em Roma, trouxe comigo um tríplice propósito: muita fé, muita coragem e muita paciência. Propósito este hoje mais atual do que nunca. Mas, uma coisa posso dizer: Em meio aos raios e tempestades do tradicionalismo legalista e do progressismo irresponsável e caótico, a partir dos anos 90, entro com grande prazer e entusiasmo em sala de aula para lecionar Liturgia.

Não foi fácil. Quando estudava Liturgia em Roma, os Rituais antigos praticamente tinham caído em desuso. Os novos ainda não tinham surgido. Importava pesquisar as fontes bíblicas, patrísticas e litúrgicas. Daí a insistência no aspecto teológico da Liturgia.

Para conciliar Liturgia e religiosidade/piedade popular surgiram pesquisas sobre devoções populares, particularmente sobre o fenômeno dos Santuários. Da preocupação teológica e espiritual da Liturgia surgiu a dezena de livros sobre a matéria e numerosos artigos, (cerca de 70) nas revistas, sobretudo na REB e no Grande Sinal. Quanto aos Santuários, participei do Primeiro Congresso Mundial da Pastoral dos Santuários em Roma e do Primeiro Congresso Latino-americano da Pastoral dos Santuários em Quito, no Equador. Assessorei vários Encontros de Pastoral dos Santuários no Brasil. Quando Reitor “virtual” do Santuário de Santo Antônio do Rio de Janeiro, escrevi o livro “Santo Antônio através de suas Imagens”, onde trato da questão do culto dos santos e do sentido dos Santuários.

Outra atividade a que a obediência me levou foi a assistência à OFS. Desde 1967 acompanhei todo o processo de renovação da OFS até hoje, na assistência de Fraternidades em nível local, Regional e Nacional.

Daí surgiram dois livros: Comentário Espiritual à Regra da OFS, adotado como livro base do tempo de formação (noviciado) na OFS do Brasil e Rezar a Vida e Viver a Oração. Pequeno Tratado sobre a Oração Cristã. Este livro brotou do serviço de assistência à OFS, através de artigos publicados na revista Paz e Bem, mas como livro é pensado para todos os cristãos, inclusive, religiosos. Um terceiro livro está para aparecer com o título provável: Felizes os que vivem em penitência. Meu Deus e meu Tudo.Também foi sendo escrito em forma de artigos para a OFS. Trata-se de um comentário da Carta aos Fiéis, de São Francisco, em sua primeira recensão, que consta hoje como Prólogo da Regra Renovada da OFS. Como livro, foi ampliado de modo que possa interessar a toda a Família Franciscana.

Outra área que gostaria de lembrar é a colaboração com a CNBB na Tradução e Edição dos Livros Litúrgicos, que considero um apostolado oculto que, ainda hoje, me toma mais da metade do tempo. Colaborei na tradução de todos os Livros Litúrgicos. A partir de 1991, quando deixei a assessoria da CNBB, foi-me confiada a Coordenação da Tradução e Edição dos Textos e Livros Litúrgicos. Tratava-se da revisão e publicação atualizada de todos os Livros litúrgicos com a inserção dos textos bíblicos aprovados por Roma para uso litúrgico. Primeiro, a revisão e publicação da 2ª edição típica do Missal Romano. Depois, a montagem dos Quatro Volumes da Liturgia das Horas (o resultado do trabalho nos três anos no Convento de Santo Antônio, no Rio de Janeiro); a Oração das Horas em volume único para os que não têm obrigação do Ofício das Leituras; a nova edição atualizada de todos os Rituais dos Sacramentos, a montagem e edição dos Lecionários; a edição do Pontifical Romano em volume único, com Lecionário do Pontifical em separado. Acrescento a este trabalho a tradução e acompanhamento de sua diagramação e edição dos Suplementos Franciscanos do Missal Romano e da Liturgia das Horas e os Rituais de Profissão religiosa franciscana.

Outras atividades que me deram muita alegria: Cursos e Encontros de Liturgia para o Clero, Religiosos, Religiosas e Leigos; pregação de retiros; assistência a religiosas, acompanhando noviciados, particularmente, de Congregações Franciscanas. Assessorias diversas no campo da Liturgia à CNBB, mesmo depois dos anos de Assessoria em Brasília, sobre questões como Pastoral dos Santuários, Missas por e de Televisão, o uso de Folhetos na Missa.

O exercício do ministério ordenado. A chama missionária da origem de minha vocação sempre me acompanhou. Mas até hoje não tive a satisfação de participar de uma Missão popular. O desejo da missão de certa maneira se realizou no exercício de Secretário da Evangelização missionária por seis anos e na permanência de dois meses em nossa missão de Angola. A obediência levou-me a priorizar o apostolado de Frade Menor, no serviço à Ordem e à Igreja, no campo do magistério e da Pastoral litúrgica, da formação, e da assistência à OFS. Compreendi esse serviço como ação multiplicadora de agentes de pastoral, de missionários. O pastoreio direto ficou em segundo plano. O serviço do ministério ordenado restringiu-se a colaborar nas celebrações nas Fraternidades onde passei, no ministério da Penitência e na animação das celebrações junto aos Grupos a que servi pelo Brasil a fora. Além disso, procurei exercer com entusiasmo o apostolado da comunicação escrita. Procuro ver como apostolado oculto mesmo a colaboração na tradução, montagem e publicação dos livros litúrgicos, o que exige, ao menos de mim, muita disciplina e ascese.

Missionário e mestre da Sagrada Liturgia

(por ocasião do aniversário de 75 anos de Frei Alberto, Frei José Ariovaldo da Silva fez-lhe homenagem, em parte aqui transcrita)

“Não lhe bastava só traduzir os livros litúrgicos! E a formação litúrgica?! Levar o clero (bispos, padres e diáconos) e o povo em geral a entender e assimilar a teologia e o espírito da Liturgia que o Concílio Vaticano II resgatava para toda a Igreja! E, coerentemente com este espírito, celebrar a Liturgia de maneira digna, adaptada e participativa! Imenso desafio para uma Igreja secularmente fossilizada numa forma de liturgia excessivamente devocional e pouco mistérica! Imenso desafio, num tempo em que o quadro de especialistas em Liturgia era reduzidíssimo. Na década de 60, tínhamos aqui um só doutor nesta especialidade, na pessoa de Frei Alberto. Só em meados da década de 70 é que começa a despontar em nível nacional outro reconhecido doutor em Liturgia, na pessoa do Pe. Gregório Lutz CSSp. Assim sendo, com toda a escassez inicial de qualificados formadores, no serviço de implantação da reforma litúrgica no Brasil, admiramos o imenso volume de trabalho de Frei Alberto e sua intensa colaboração através de seus escritos (livros e artigos), cursos, assessorias na CNBB, em dioceses, paróquias, Seminários, Faculdades e Institutos Teológicos. Assim, apaixonado pelo mistério do culto e da Igreja, Frei Alberto legou a uma multidão de admiradores, leitores, alunos, discípulos e ouvintes seus, a certeza de que a Liturgia, por ser divina, isto é, expressão máxima do amor de Deus, merece ser muito bem celebrada: com convicção, piedade, de forma orante e verdadeira, fiel às orientações da Igreja, com muito amor e gratidão a Deus e, consequentemente, com dedicado compromisso comunitário. (…)

E hoje, já próximos do cinquentenário da “Sacrosanctum Concilium”, louvando e agradecendo o Altíssimo Senhor Deus e Nosso Senhor Jesus Cristo e o Espírito Santo Paráclito, sinto uma vontade louca de proclamar – e o proclamo, sim, com a permissão de todos! – Frei Alberto Beckhäuser, grande missionário e mestre franciscano da Sagrada Liturgia renovada do Concílio Vaticano II para o Brasil, para a América Latina e Caribe, para a Igreja; referência para a Liturgia do Povo de Deus nesta terra de Santa Cruz. Parabéns, Frei Alberto, e “ad multos annos”!”

Que o Senhor acolha o Frei Alberto na Liturgia perene do Céu, no culto daqueles que, nesta terra, procuraram a Ele servir e adorar.

R.I.P.            

 

 

Fonte: Franciscanos

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